Mais que uma Palavra Bonita, uma Lei

Vamos direto ao ponto: quando a gente fala de Umbanda, a palavra “caridade” aparece o tempo todo. Mas o que isso quer dizer de verdade? Não é só dar uma cesta básica ou uma esmola. Na nossa fé, caridade é a viga mestra, o alicerce de tudo. É a lei. Se a gente não entender isso a fundo, a gente não entende a Umbanda.
Este texto é uma conversa de irmão pra irmão. A gente vai mergulhar fundo no porquê de a caridade ser tão fundamental. Não é pra ser “bonitinho”, é pra ser verdadeiro, pra gente entender como essa força move nossos guias, nossos médiuns e a nossa própria vida. A gente vai ver que a caridade é, ao mesmo tempo, a nossa maior ferramenta de trabalho, o nosso maior remédio e o nosso caminho mais seguro de evolução.
A Base de Tudo: “A Manifestação do Espírito para a Caridade”
Ponto de Partida: O Grito do Caboclo das Sete Encruzilhadas
A gente precisa voltar lá pra 1908. O jovem Zélio de Moraes, um rapaz que sofria com sua mediunidade, foi levado a um centro espírita kardecista. Durante os trabalhos, ele recebe um espírito altaneiro, de gestos firmes, que se apresenta como Caboclo das Sete Encruzilhadas. E o que acontece? Pedem pra ele se retirar. O motivo? Porque ele era um “índio”, um espírito considerado de “pouca evolução” pros padrões da época. O Espiritismo daquele tempo era elitista, só queria saber de doutor, de filósofo, de militar de alta patente. Índio, preto-velho, gente do povo… não servia.
E qual foi a resposta do Caboclo? Ele não baixou a cabeça. Ele anunciou que no dia seguinte, na casa do Zélio, ia começar uma nova religião. E qual foi a primeira frase, a pedra fundamental dessa nova fé? “A Umbanda é a manifestação do espírito para a CARIDADE”. Ele não parou por aí. Deixou claro qual seria a lei daquela nova casa: “Com os espíritos mais evoluídos aprenderemos. Aos mais atrasados ensinaremos. E a nenhum renegaremos!”.
Isso é o DNA da Umbanda. A caridade, desde o minuto zero, foi a resposta direta à exclusão, um ato de rebeldia espiritual. Onde uma porta se fechou por preconceito, a Umbanda abriu um portal, dizendo: “Aqui todo mundo é bem-vindo pra trabalhar pelo bem, não importa se foi doutor ou escravo, branco, negro ou índio”. A Umbanda nasceu, portanto, como um ato de correção doutrinária, definindo sua identidade na prática da caridade universal, em oposição direta ao elitismo que a rejeitou. Cada vez que um terreiro abre as portas e pratica a caridade sem cobrar, sem perguntar a classe social, sem julgar o espírito que se manifesta, ele está reafirmando essa identidade fundadora. A proibição do sacrifício de animais e da cobrança por trabalhos não são regras aleatórias; são marcadores de identidade que solidificam o caminho próprio da Umbanda, diferenciando-a de outras práticas e reforçando que seu alicerce é o amor incondicional.
Caridade Não é Favor, é Lei Divina
É preciso tirar da cabeça a ideia de que fazer caridade é fazer um favor pra Deus ou pros Orixás. Eles não precisam disso. Olorum é o Criador de tudo, a energia primeira, o Poder Supremo. Os Orixás são Suas manifestações divinas, Seus poderes, Suas qualidades que se espalham pela Criação. A caridade é uma Lei da Criação, um princípio fundamental do equilíbrio cósmico. Como bem disse Rubens Saraceni, “fora da caridade e da fraternidade não há salvação para ninguém”.
A caridade é o que nos alinha com o fluxo da evolução, é o que nos torna instrumentos da Justiça e do Amor Divino. Quando um guia atende alguém, ele muitas vezes age como um “médico” da alma: primeiro ele salva, ampara, alivia a dor imediata; depois, ele entrega a pessoa à Justiça Divina, para que ela mesma, com o aprendizado, se ajuste e cumpra o que for necessário para sua evolução. A caridade é essa primeira ajuda, esse ato de misericórdia que dá à pessoa a chance de se reerguer. É a Lei do Amor em ação, antes que a Lei da Justiça precise cobrar de forma mais dura.
Desmistificando o “Toma Lá, Dá Cá”
Muita gente se afasta da Umbanda ou a critica porque acha que é um “comércio com o santo”. Faz uma oferenda, ganha uma coisa. Isso é uma distorção grave, uma visão empobrecida que depõe contra a nossa fé. A verdadeira caridade não espera pagamento, não faz troca. É por isso que a Umbanda proíbe explicitamente que se cobre por qualquer trabalho espiritual. O lema é claro: “dar de graça o que de graça recebemos”. A mediunidade é uma missão, uma ferramenta para a prática da caridade, e nunca, jamais, uma profissão.
As oferendas, que muitos confundem com pagamento, são na verdade ferramentas mágicas. Elas servem para ativar mistérios, para extrair energias da natureza e criar um campo de força para que os guias possam trabalhar em nosso benefício. O guia não “come” a comida ou “bebe” a bebida; ele utiliza a energia, o axé daquele elemento para realizar seu trabalho de cura, limpeza ou proteção. A proibição de cobrar e o entendimento correto das oferendas são parte essencial da prática da caridade. Eles garantem que a nossa relação com o sagrado seja de amor, fé e respeito, e não de troca comercial. Isso mantém a pureza do trabalho e protege tanto o consulente quanto o médium de se envolverem em práticas que não levam à evolução, mas sim ao vício e ao engano.
Saravá, Axé, Mojubá!
Raphael PH. Alves
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